sexta-feira, 28 de março de 2014

Relato de uma menina

Estava aqui a recordar-me do dia em que o meu avô teve um ataque cardíaco.

Eu tive de ir ao hospital por causa de uma infecção respiratória e ele aproveitou a "boleia" já que andava há cerca de 15 dias com umas pontadas e umas dores no peito...

Fui eu que fiquei com ele lá. Não percebi ao início o porquê de a médica de repente começar a fazer-lhe um eletrocardiograma.

Mas ao fim da tarde lá se soube. Ele tinha ido para Braga, para a UCI coroários e ia lá ficar uns dias. Para recuperar e para determinarem se se justificava operar.

Passei uma semana a ir visitá-lo todos os dias ao hospital, sozinha. Um dia estava lá eu, e chegou uma moça de bata que me pediu para falar a sós com o meu avô. Ai! que aperto no estomâgo. E ela falou e falou e falou. Parecia que o raio da porta nunca mais se ia abrir quando ela finalmente saiu.

Perguntou-me se eu era familiar. "Sim sou"... E começou a falar comigo. A dizer-me coisas que eu despachava, explicações que já entendia. Quis saber se eu era médica, se estudava medicina. "Não nada disso." Ela, confusa, continou, com mais do mesmo, até me dizer que não servia operar, porque o músculo cardíaco estava morto e não servia de nada reparar o vaso se assim era. Disse que tinha sido lento, que se tinham formado ramificações secundárias para compensar o bloqueio.

Eu só queria desfazer-me. Ali naquele momento. Mas não. Tinha de me comportar como uma menina crescida e ouvir tudo até ao fim. Como a minha mãe faria. Mas custava demais. Já deviam ter passado uns dez minutos desde que a médica se tinha ido embora, mas eu ainda não tinha regressado para o pé do meu avô. Compus um sorriso que quase, quase se desfez quando entrei no quarto e vi a cara de assustado do meu velhote. Parecia-me branco mas eu não podia falar muito já que não sabia como eu própria estava.

Tentei animá-lo e aligeirar a situação. Não tive a certeza se teria resultado. Estive lá bastante tempo acho eu.

Quando voltei para casa liguei à minha mãe para a pôr a par da situação.

E mal desliguei a chamada desfiz-me em lágrimas.


Desde pequenina que o que mais me assusta é perder os meus avós. E conforme os anos passam e vejo a idade apoderar-se deles o meu medo passa de trote a galope, da cabeça ao coração mais depressa do que lhe devia ser permitido. E sinto-me pequenina. Mais pequenina do que um grão de arroz.

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